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Quando aparecem gravações de políticos recebendo dinheiro de corrupção, logo surgem os defensores a culpar as imagens. Antes das câmeras, os deslizes eram gravados somente em voz. Aí, alguns negavam as vozes ou não lembravam o ocorrido porque estavam meio grogues de remédio, meio embriagados, ou sonolentos. Esses argumentos eram tão comuns e convincentes quanto às recorrentes justificativas do enriquecimento dos políticos da noite para o dia, cujos exemplos maiores são do Lulinha, filho do ex-presidente e do genial Palocci.
Como dizem nossos políticos, desvios e corrupção existem no mundo todo. E é verdade; embora nunca citem a diferença de que na maioria dos países desenvolvidos ela seja exceção, enquanto por aqui é a regra absoluta e reinante. O fato mais relevante não seria o tratamento igual entre a exceção, lá, da regra, por aqui, mas como o problema é encarado pelos envolvidos e a sociedade lá fora e aqui.
Lá, as instituições apuram os fatos e tratam com maior rigor as pessoas que se aproveitam da função pública para servir de exemplo. Por cá, as autoridades são as primeiras a traçarem defesa prévia e isso foi visto com o procurador-geral da República no caso do enriquecimento do ministro Palocci. Ora, senhor defensor da lei, a regra de que ninguém é culpado sem condenação serve, na mesma proporção, para não inocentar ninguém antes da apuração. Mesmo as apurações marias-moles, ou de faz-de-conta, como são as daqui. Os institutos de pesquisa, que tanto trabalham nas eleições, deveriam perguntar se o brasileiro acredita nas apurações quando os envolvidos são de vereador para cima.
Aqui, as coisas mais absurdas acontecem e são tratadas como se nada de anormal tivesse acontecido. Aqui, nada passa do razoável. No caso do enriquecimento de Palocci, é anormal por si. Não há na história da humanidade quem tenha conseguido multiplicar por 20, em quatro anos, o que levou uma vida inteira de quase 60 anos para conseguir. Somente o roubo, o tráfico ou outra atividade dessa natureza pode gerar fenômeno igual. Como eu, qualquer um que duvidar da regularidade desse enriquecimento, será ridicularizado.
Como Valtaire, defenderei até a morte o direito de ele se explicar, mas não acreditarei numa vírgula do que ele disser. Esse enriquecimento só é aceito pelos políticos brasileiros e suas assessorias, dentre eles, alguns jornalistas. Não me convencerá nem se ele disser que teve mais sorte do que o anão João Alves e ganhara mais de 200 vezes na loteria, a outra forma lícita de enriquecimento relâmpago, além de herança.
O senso do ridículo precisa chegar aos meios políticos e a todos os agentes públicos. A cara-de-pau com que tentam convencer do impossível é de deixar todos descrentes de que este país ainda tenha algum jeito. Aceitar que é mera coincidência a liberação, por um órgão do governo, de milhões para uma empresa no mesmo período em que ela doa milhões para a campanha do candidato do governo federal é simplesmente conveniência ou cinismo, para ser ameno.
Palocci pode muito; pode quase tudo. Pode até ensinar aos seus consultores a ganhar o reino dos céus; mas deve ter feito aula com o delegado Di Rissio, de São Paulo, que comprara um apartamento de mais de 1,5 milhão, e tinha outro acertado por quase o mesmo valor, com um salário de pouco mais de 8 mil reais. Ele pode comprovar documentalmente tudo. Mas é preciso ser insano para acreditar que alguém é capaz de pagar vinte vezes por um serviço apenas pela qualidade do executor. Esse tipo de justificativa precisa de um sonoro e definitivo basta. Este país precisa dar uma basta em muita coisa; nas inexplicáveis coincidências; no enriquecimento descomunal dos políticos, especialmente dos prefeitos, indistintamente, que se tornam gênios após eleitos; nas apurações que nunca resultam em nada, sempre quando o envolvido é do andar de cima. Basta, Brasil, basta!
Da mesma forma que tudo será justificado devidamente, é possível que somente os críticos venham a ser punidos. O mensalão é exemplar. Só a funcionária que não aceitou participar do esquema foi penalizada. Mera coincidência. Daqui a um ano Palocci deverá estar duzentas vezes mais rico apenas com os recursos das indenizações pagas pelos que duvidaram da sua fase de Midas.
Quero declarar ao procurador-geral da República, à senhora presidenta da República, à corriola de senadores e deputados federais e todos os defensores ou coniventes com essa indecência, que este cidadão defende e avoca o seu direito subjetivo de não acreditar numa vírgula sobre a regularidade desse enriquecimento, independentemente da prova que vier, pelo simples fato da impossibilidade. Com todos os pés atrás, aceitaria até o dobro, com exagero absurdo, o tripulo, mas por 20, nunca.
Pedro Cardoso da Costa – Bel. Direito